A competência do foro em ações contra o Estado
10 jul 2020
Goiânia, GO
Setor Oeste
Guilherme Franco Ribeiro[1]
Com a pandemia, o Brasil e o mundo enfrentam além de uma crise sanitária sem precedentes, um desequilíbrio financeiro em diversos setores da economia. A máquina produtiva de pequenas, médias e grandes empresas estão imergidas em estado de estagnação, provocando um óbice na “sobrevivência” destas frente à situação calamitosa vivenciada.
Em razão disso, evidentemente haverá aumento nos casos de insolvência, tornando o não pagamento aos credores um fator costumeiro às empresas. Apesar de ser prematuro traçarmos uma perspectiva quanto a gradação nos casos de falência e de recuperação judicial, é factível que seja um elemento a se considerar – já visível neste momento.
A fim de amenizar essa questão, está aguardando apreciação pelo Senado Federal o Projeto de Lei nº.1.397/20[2], que institui medidas de caráter emergencial, mediante alterações – de caráter transitório – de dispositivos da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005[3].
Aglutinados ao Projeto de Lei, há fatores que podem auxiliar as empresas que buscam o soerguimento financeiro, frente a impossibilidade de se ver cumprida todas obrigações assumidas com eventuais credores. Afinal, conforme dito, seu objetivo basilar é instituir medidas de urgência destinas a prevenir a crise econômico-financeira de agentes econômicos, refletindo diretamente, mesmo que de maneira transitória, na recuperação judicial de empresas.
Apesar de louvável o Projeto de Lei em trâmite, incontestavelmente sua aplicação não irá absorver os impasses que recaem rotineiramente ao Poder Judiciário. A norma quando confeccionada não possui um teor exauriente por excelência, ou seja, seu intuito precípuo é expor regras gerais, cabendo ao magistrado imprimir uma elasticidade relativa por meio da interpretação, com propósito de garantir preceitos essenciais.
Nas palavras de Carlos Maximiliano Pereira dos Santos[4], não pode o povo imobilizar-se dentro de uma fórmula hierática por ele próprio promulgada; ela indicará de modo geral o caminho, a senda, a diretriz; valerá como um guia, jamais como um laço que prenda, um grilhão que encadeie[5].
O jurista, com um discurso além de seu tempo, realça a prática de uma exegese lúcida e polida a ser praticada nos dias atuais. Não obstante, conduzindo esse estudo hermenêutico à Recuperação Judicial, temos que a tratativa do magistrado frente a uma empresa mergulhada em crises financeiras deve, sem dúvidas, ser carregada de demasiada cautela.
Indubitavelmente, a busca pela essencialidade da norma tornará um fator de destaque em tempos de pandemia.
É indiscutível que lacunas e contradições permeiam as legislações nacionais. Nesse sentido, a leitura, e mais importante, a interpretação (da Lei) deve ser focada de modo a garantir a superação da empresa, caso contrário, vamos nos deparar com enxurradas de falências e recuperações judiciais. Com efeito, a crise econômica nacional será um fator inarredável.
Há de se convir que as funções sociais desempenhadas por uma empresa, dentro de suas proporções, são capazes de gerar um vasto círculo de emprego, economia e renda para determinadas regiões. Assim, o trato jurídico no âmbito de processo recuperacional, mais do que antes, deve priorizar o efetivo soerguimento da empresa.
Como exposto em linhas anteriores, a legislação em seu âmago busca tratar linhas gerais sobre o tema, não possuindo competência para percorrer todos as problemáticas sociais que surgem rotineiramente. Cabe ao aplicador da norma dirimir tais questões, buscando uma efetiva justiça social.
Infere-se que a letra da lei perdura, todavia, a vida continua não podendo o jurista esperar a inércia perpétua do legislativo mórbido.
[1] Graduando do curso de Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), pesquisador bolsista de Iniciação Científica pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e estagiário do escritório Crosara Advogados.
[2] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2242664. Acesso em 20 de julho de 2020.
[3] Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.
[4] Grande jurista brasileiro. Durante sua trajetória no Direito ocupou os seguintes cargos: Ministro da Justiça, Procurador-Geral da República e Ministro do Supremo Tribunal Federal.
[5] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito.21.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018 (Fora de série)